sábado, julho 11, 2009

COMBATENDO OS COMPORTAMENTOS ALZHEIMERS DOS NOVOS TEMPOS (ou: Precisamos contar – e ouvir – mais histórias!)

(Caio Borges)










Na novela “Caminho das Índias", a personagem Laksmi, matriarca da família, vive criticando a nora, Indira, por não ensinar nada aos filhos sobre os costumes e viver arrastando o sári pelo mercado, fazendo seu comércio. A nora, por sua vez, se sente angustiada porque, muito embora saia para fazer seu trabalho, não descuida da casa e muito menos dos filhos, repassando-lhes os valores e ensinamentos familiares e coletivos que devem ser preservados. Estes, os filhos, por outro lado, se situam no mundo pós-moderno, globalizado e sofrem a influência do seu tempo. Ouvem os mais velhos, mas pensam diferente deles e se recusam, muitas vezes, a aceitar se comportarem conforme os ensinamentos e tradições. E por aí seguem-se os conflitos entre aquelas gerações.


Olhando esse fragmento da novela, aqui bastante resumido, fica uma reflexão sobre o que parece ser hoje uma entre as muitas angústias dos tempos atuais. Seja no âmbito familiar ou fora dele, onde os comportamentos e suas digressões – tanto da juventude, quanto dos adultos - parecem assaltar a sociedade atual.

Na contemporaneidade, a tradição e os bons costumes herdados do passado são associados a atraso em oposição a progresso. Não há mais valores reconhecidos e estabelecidos como fundamentais para conferirem sentido às nossas existências. O insólito hoje é ter comportamentos pautados em valores. Perdeu-se o sentido das experiências acumuladas oriundas de um tempo pretérito como instrumento de redenção, cujos acontecimentos re-per-cutiriam no presente, ampliando vivências e acontecimentos. A experiência contemporânea não se faz mais por meio do excedente de sentido das tradições que poderiam nos orientar e nos ajudar - na vida e no pensamento – a en-frenta-rmos o mundo com fortuna e boa sorte. E dele naturalmente desfrutarmos e apreciarmos de uma forma saudável, com prazer e alegria de viver.


Segundo o filósofo Walter Benjamin, no mundo (pós)moderno, vivemos não só a experiência da pobreza, mas a pobreza da experiência. Ou seja, a experiência de um presente vazio, carente de recordação. Nas suas palavras, “as rugas e marcas em nosso rosto são as assinaturas das grandes paixões que nos estavam destinadas. Mas nós os senhores não estávamos em casa”.


Vive-se, na atualidade, não mais sob uma Sociedade do Escândalo e, sim, sob a égide de uma Sociedade do Sensacionalismo ou Espetaculosa (ou do Marketing reforçando e criando fetiches e outras ideologias e falsas felicidades), movida a impactos tanto súbitos, quanto breves.


Na Sociedade regida pelo Escândalo existe uma ética. O fato que escandaliza por transgredir as regras e os costumes sociais salta a olhos vistos e é, imediatamente, repelido pela sociedade como um todo. O grupo social tem valores que respeita e deseja verem preservados. Por isso mesmo, repudia o ato e exige sua correção e imediata volta à normalidade.


Na Sociedade Sensacionalista, ao contrário, os atos transgressores são imediatamente absorvidos, metabolizados, sem que haja a contrapartida da exigência do retorno à normalidade. A sociedade assimila praticamente tudo! Sem exemplaridades, sem aperfeiçoamentos ou possibilidades de aprendizados coletivos! Há uma patologia de valores. Uma banalização. Perdem-se os critérios para se reconhecer o que é belo ou feio, o que é bom ou que é mal, o que tem ou não dignidade. Praticamente tudo parece ser permitido e admitido. Seja em nível individual, social, ou político. Tudo pode ser exposto, exibido, mostrado. Como numa pornografia!


É evidente que não é o todo do passado que deve ser preservado! Não se quer advogar a tese de que estamos aqui para viver de relíquias ou mausoléus históricos, muito embora nossas raízes históricas – sejam elas pessoais, familiares ou coletivas – continuem nos conferindo um sentido do exemplar e uma orientação para encararmos a vida que se coloca diante de nós a cada instante.



É forçoso reconhecer que o mundo muda, a sociedade se transforma, a vida se recicla e o universo se encontra em constante expansão! Porém, recepcionar do passado aquilo que continua aguçando nossos sentidos e valores e que pode nos fortalecer e nos ajudar – alargando nosso conhecimento e sensibilidade – na travessia pelo presente, deve ser não tão-somente preservado, como também reinterpretado como memórias – ou tesouros! – que não deveriam ser esquecidos. Ou que merecem ser resgatados e respeitados. Somos feitos ao mesmo tempo de esquecimentos e lembranças!



Sem as marcas do tempo – sejam elas as rugas no nossos rostos, ou na memória pessoal, familiar ou coletiva – não temos história. Sem história não temos vínculos. Sem vínculos, estamos desgarrados, à deriva. Onde buscaremos nossas “réguas” e “compassos” para geometrizarmos nossos novos espaços?!

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