terça-feira, julho 21, 2009

DENTRO DE UM ARMÁRIO

(Klint)


Dentro do armário respiro a vida que pulsou – e ainda pulsa! – dentro de mim. As muitas coisas ali guardadas não me explicam o que sou. Continuo perplexa diante do Insondável Mistério, mas gosto de pensar que sei um pouco de mim.

O espelho, que tenta me revelar, traz-me apenas uma fluida imagem. Mesmo assim, escolho com cuidado e graça a roupa que devo vestir e as cores que irão combinar com meu dia. Passo o batom nos lábios traçando seu contorno com apuros de mulher. Sou vaidosa. Coloco um pouco de blush nas faces, um leve risco de lápis para acentuar o olhar e, pronto! Estou preparada para a Vida!

Diante de olhos que querem ver além, um pouco além, só a pobreza deste instante perplexo que nada diz. Nada consigo ultrapassar além deste momento de dúvidas e inquietações. O que virá depois disto? O que as próximas horas me revelam além de uma agenda de compromissos e afazeres diuturnos? Melhor pensar que tudo estará certo no seu devido lugar. Que a agenda será cumprida em seus mínimos detalhes e que quando a noite chegar um travesseiro macio e um bom cobertor me esperam. E, se for afortunada, também uma boa e longa noite do amor feito sem pressas e com gozos infinitos!

Não quero os detalhes sórdidos das noticias que os jornais da noite espalham com alarde tirando-me a paz e fazendo-me pensar, com enorme pesar, que ainda vivemos num caos primordial e informe. Desligo a televisão, queimo os jornais e procuro nutrir-me de amenidades. Os homens insanos continuam por ai. Não os ignoro por uma questão de sanidade. Mas deles também não quero um vintém sequer!

São tantas as armadilhas, tantas as maneiras de me tirar a alegria de viver que prefiro me proteger. Minha couraça, aquela que construo com cuidados de bicho-da-seda, na verdade, são tão frágeis e delicadas como uma flor inocente à beira do caminho, disponível e prestes a ser subitamente arrancada. Que posso fazer a não ser ofertar a beleza e perfume desse momento também tão inocente! Nada mais me resta! Não tenho outra opção a não ser esta entrega imediata. Se o instante que vier for um desastre, esta entrega há de ser mesmo inevitável! Então, que seja,ao menos, carregada de beleza!

Destinos, horóscopos, adivinhações, quiromancias? Tão confortáveis! Mas leves como um véu transparente ao vento! Não me protegem dos raios e das tempestades! E muito menos do frio! Mas gosto de pensar que estou que de alguma forma amparada por essas linhas e que elas podem me revelar alguma coisa do insondável mistério. Me agarro então a elas! Já que preciso me nutrir de alguma forma, que seja de sonhos! O resto será, como já disse um grande mestre, silêncio!

E memórias guardadas dentro de um armário! Com uma pálida sombra de minha estória!


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