terça-feira, julho 07, 2009

O ESPETÁCULO DA TRANSGRESSÃO E A MINIATURA DO MUNDO


Dedicado

às oficinas de teatro do SESC

aos diretores que por lá passaram e

aos colegas de oficinas.

Todas essas pessoas

Contribuíram (mesmo sem saber)

para me ensinar

como superar (um pouquinho mais)

meus medos

num palco chamado Vida.



Era o nosso último ensaio para a apresentação do dia seguinte. Cada um de nós dispunha de um texto específico, cuja performance seria uma criação nossa. Ou seja, deveríamos livremente descobrir uma forma de interpretá-lo. Em seu todo, a apresentação era composta de quadros seqüenciais, porém, isolados, completos em si mesmo. Uma das cenas – nada comprometedora - a serem apresentadas era a de uma relação afetiva envolvendo dois personagens homossexuais. Os colegas L... e T.... chegaram preocupados. Não haviam conseguido “in-corpo-rar” o texto e nem os personagens. L...... encaminhou-se até nosso amável e sensível diretor Rodrigo e falou: - Olha, cara, não vai dar! Travou! Surpreso, o diretor respondeu: - Como assim, não entendi! O que foi mesmo que aconteceu? Travou????!!!!!


Rodrigo assistiu cada uma de nossas performances no palco, repetiu-as quando achou necessário, sugeriu mudanças em alguns pontos específicos, sempre - como era do seu estilo - procurando respeitar a criação do grupo e dar o melhor de si para o bom resultado. Conforme de costume, ao final dos ensaios/apresentações, sentamo-nos em círculo, no chão, para refletir sobre os trabalhos apresentados, ouvir-nos uns aos outros e, sobretudo, “escutar” o que o Rodrigo tinha a dizer – sempre com propriedade!

Lembro-me dele, muito sério, falando: - Gente, as palavras de L.... ainda não me saem da cabeça. Eu até agora não consegui entender! Ele não consegue fazer a cena porque “travou”! Que estória é essa??!!! Gente não trava, quem trava é computador!!!!


Oficinas de teatro são assim: PU-RA-E-MO-ÇÃO! Um verdadeiro remédio chamado “Teatricina”! Estamos ali não só para nos divertirmos, mas também para aprendermos sobre a vida e nossa humanidade representada por inúmeros personagens, com suas personas e máscaras herdadas desta nossa ancestral cadeia genética. Uma fração do “eu/personagem” revela toda nossa carga de SER HUMANO. E, naquele momento, todas as emoções podem nascer. Podem transbordar e escorrer pelo nosso corpo e nossa voz. Mansas ou fortes. Carregadas de tristeza ou de alegria. Moduladas por indecisões, tremores, arrepios, fragilidades. Como num (re)nascer às avessas. Só que livre de perigos!


O teatro (e a arte como um todo!) é o espaço da transgressão. Ali todas as loucuras, desejos, ambições, sonhos, bondades ficam evidentes. Denuncia ao mesmo tempo em que diverte e emociona. O palco se transforma numa miniatura do mundo, mas o que se vive ali é uma ficção!


Lenta e progressivamente as palavras vão nominando o real e criando uma realidade. Mas não temos o direito de nos (mal)tratarmos assim. Não somos máquinas humanas, embora o afeto nos tempos pós-modernos esteja extremamente descartável. Não somos computadores. Não fazemos back-ups, upgrades, updates. Não apertamos a tecla pause, nem deletamos nossas emoções, sentimentos, sensações. Não reinicializamos ou desconectamos. Não plugamos ou desplugamos, muito embora as transas do amor solitário hoje já ocorram nos teclados de um computador.


O mundo parece estar precisando de overdoses de Teatricina! Este remedinho mágico ressuscita vivos e moribundos, cura comportamentos caducos, solidão e falta de amor.


Uma salva de palmas para todos aqueles que estão se redimindo nos palcos, seja da vida ou do teatro! Sem nos esquecermos de que, em tudo na vida, é a nossa cabeça quem comanda o espetáculo!


1 - Aviso aos incautos: Rodrigo é muito bem casado com uma mulher linda e pai de uma filha mais linda ainda! Como todo artista, sua bastante a camisa para ganhar o pão-nosso-de-cada-dia, mas ama o que faz.


2 - L... e T... acabaram não apresentando seu quadro.

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